A. Bame Nsamenang foi um pesquisador nascido em Camarões, professor de psicologia e ciências do desenvolvimento. O camaronês trouxe, em seus estudos, contribuições para pensar infância, desenvolvimento, aprendizagem e educação desde uma perspectiva africana. No presente texto, trazemos uma síntese - e alguns trechos completos - do trabalho "Toward a philosophy to Africa's education".
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Imagens da vida familiar de Nsamenang
Destacamos que, apesar das diferenças geográficas, históricas e políticas do continente africano - local de produção da pesquisa do autor - em relação à sua diáspora forçada para o Brasil, entendemos que a produção de Nsamenang pode contribuir para pensar a educação de pessoas africanas (pretas) em diáspora nesse território.
África, filosofia africana e suas fontes
Sem raízes nas experiências e meios de existência africanos, a filosofia da educação será reduzida a "ginástica intelectual" e não à utilidade no mundo real. A disposição para a filosofia esteve presente em diferentes grupos culturais muitos séculos antes do domínio realizado pelo pensamento greco-ocidental. Assim, hoje é necessário que a África se esforce para superar o crescimento da filosofia grega a fim de desenvolver sua própria filosofia da educação.
Uma visão de mundo africana reconhece a humanidade de todos, imputa espiritualidade à família e situa a criança não como soberana, mas socialmente fundamentada em sua família estendida. Nesse sentido, é preciso admitir que diferentes culturas não visualizam o mesmo ponto final no desenvolvimento das crianças dentro da sociedade. A cultura é provedora de configurações para a educação de crianças, portanto cada grupo cultural pode ter diferentes objetivos para a formação das pessoas que chegaram mais recentemente a esse mundo.
Uma filosofia africana para a educação não precisa esperar pela ação de filósofos acadêmicos, mas sim aprender desde as fontes orais no local onde nasceu a humanidade. A filosofia africana é preservada por "outros canais além da escrita, como mitologias, provérbios sábios, contos populares e ideias e práticas religiosas" (p. 60).
Nesse contexto, podemos pensar nas comunidades africanas como vindas de um rio com diferentes saídas afluentes, de onde vem coisas em comum como as instituições sociais e políticas, a crença na ancestralidade, a existência de um ser supremo e o valor da família estendida. Embora por vezes as diferentes culturas africanas configurem esses elementos de uma maneira distinta, eles se fazem presentes. "O papel das tradições orais e uma abordagem comunitária para a educação das crianças em pedagogias participativas também são características comuns em toda a África subsaariana" (p. 61).
Então, o desafio é entender o que está por trás das ideias e práticas das grandes mentes de África: qual é seu raciocínio? Assim, desenvolver, a partir do contexto intraduzível das máximas, provérbios, contos etc. uma filosofia para a educação africana que incorpore explicitamente epistemologias e pedagogias africanas. Então, vale a pergunta: como construir isso junto a outras filosofias?
Educação ocidental x educação africana
"A escola primária ocidental é um local de aprendizado organizado para manter as crianças longe de ambientes adultos; ela prepara para papéis maduros dando tarefas improdutivas distantes das realidades de subsistência das crianças" (p. 61). Isso leva a formar crianças como reprodutores, prontas a serem preenchidas com conhecimento e valores.
Por outro lado, pais africanos criam espaços de participação que permitem que as crianças emerjam por elas mesmas, colocando a responsabilidade menos nos adultos e mais nas crianças. A educação dos pais encoraja as crianças desde cedo a enfrentarem desafios e tomarem responsabilidade ao refletir sobre as próprias condições de vida.
"Assim, a responsabilidade pela aprendizagem das crianças recai menos sobre os pais ou outros adultos e mais sobre as próprias crianças que vão emergindo ou 'chegando' gradual e sistematicamente a status mais maduros como coparticipantes, primeiro, como novatos em culturas de pares e, mais tarde, como participantes credenciados na vida social e econômica da família e da comunidade. Desta forma, as crianças 'se graduam' de um nível de papel e esfera participativa para outro até que gradualmente façam a transição para papéis adultos. Meninos e meninas preparados para a vida adulta são mais avaliados quanto à competência social, às questões sociais, morais, intelectuais e práticas das culturas de pares do que em outros critérios" (p. 61-62).
Uma filosofia africana para a educação de África
O acesso restrito das crianças a ambientes produtivos na educação ocidental contrasta com a configuração africana de aprendizagem participativa que destaca o "tornar-se". Crianças não são organismos a serem moldados a um padrão de comportamento ou a resultados educacionais, mas como recém-chegados à comunidade de prática que se apropriarão de um sistema de significados que informa tais práticas.
Assim, "uma filosofia africana da educação deve colocar a agência das crianças no centro dos processos de aprendizagem [...] Devemos imaginar uma filosofia da educação que permita às crianças e suas famílias serem participantes em uma educação produtiva. Se adotarmos uma visão de mundo africana, teremos um olhar holístico e integrado sobre a família e o universo e isso deve nos informar para filosofar e planejar a educação em novos caminhos, que sejam sensíveis ao desenvolvimento da criança africana" (p. 62).
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